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  • Rosângela Aguiar

As primeiras chuvas chegaram

As primeiras chuvas chegaram, tímidas, eventuais. É setembro, mês das flores, do verde mais verde. A jabuticabeira no quintal da casa clamava pela chuva há meses. O caule seco e as poucas folhas verdes pediam chuva. Com as primeiras gotas, os brotos vão surgindo no caule seco. As chuvas ficam menos intermitentes e a jabuticabeira no quintal floresce. Folhas verdinhas entremeadas com pequenos pontos pretos.

É... a fruta começa madurar. Aos poucos o caule fica tomado de bolinhas pretas. Ah.... as jabuticabas! Elas têm gosto de infância. Chupar jabuticaba no pé faz as lembranças ficarem vivas, a gente viaja no tempo. Parece que foi ontem. No quintal repleto de pés de jabuticaba as crianças brincavam, subiam no pé, pegavam a fruta doce e chupavam até não aguentar mais. A avó chamava para o almoço, mas ninguém queria ir. Chupar jabuticaba no pé é muito melhor...pisar na terra ainda úmida, correr entre as dezenas de árvores carregadinhas desta fruta doce, de sabor peculiar. A avó ralha com as crianças. É hora do almoço. Elas se lavam no rego d’água em frente à cozinha e sentam-se à mesa para desfrutar mais uma iguaria. O cheiro era bom, valia a pena deixar as jabuticabas para depois. O fogo ardia no fogão, os pedaços de madeira já tinham virado brasa e deixavam a comida quentinha nas panelas de ferro.

O feijão, fresquinho, temperado de um jeito que só avó sabia fazer, o arroz branco, a galinha frita. A avó gostava de agradar os netos e netas. Tinha batata frita. As crianças se lambuzam com a comida, mas pensando na sobremesa: as jabuticabas. Elas querem voltar para o pomar, pisar na terra molhada e subir bem alto nas árvores para pegar aquelas bolinhas pretas, as mais altas. Ah... as dos galhos mais altos são as mais saborosas, as primeiras a madurar. As crianças voltam cheias de pintas roxas em todas as partes do corpo, das roupas. Nada escapa. Como brigar com as crianças? Elas estavam apenas sendo crianças, aproveitando as delícias do campo. Elas não viam isso na cidade grande que moravam. E a mãe logo pensa, vou levar uma lembrança pra elas. As frutas iriam se perder, era muito tempo de viagem de carro.

E resolve fazer a geleia da fruta. A mãe pega o tacho de cobre, acende novamente o fogo, coloca as jabuticabas devidamente lavadas e amassadas, e deixa ferver. Logo, logo a geleia fica pronta. A calda ferve no fogo baixo e aos poucos vai engrossando, ganhando aquele aspecto de geleia. O dia seguinte vai ser das crianças se lambuzarem com a geleia de jabuticaba. A cor roxa fica intensa. Enquanto o tacho está no fogo, a mãe, com a ajuda da avó, prepara os potes de vidro. Ferve a água, esteriliza. Pronto.

Agora é só esperar a geleia ficar pronta e depois guardar os potes para levar pra casa. Quando chegam em casa, lá na cidade grande, logo as crianças perguntam: Mãe, podemos comer pão com geleia de jabuticaba? Ah, deixa! A mãe tem muito o que fazer. Chegaram em casa na hora do almoço, mas ela não resiste àquelas carinhas de desejo e deixa elas matarem a vontade. Afinal, tão cedo eles não vão comer jabuticabas, só nas próximas férias...

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