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  • Foto do escritorMarcus Vinícius Beck

Diário de uma noite bêbada qualquer

Amigo boêmio, amigo sofredor, é o seguinte: se a vida dói, drinque caubói, nem que seja para cantar aquela máxima do tio Reginaldo Rossi no pé do ouvido do garçom, “saiba que hoje ela vai se casar/ mandou uma carta para me avisar/ deixou em pedaços meu coração”. Não importa a hora, pode ser durante a exibição do Coringão, ou no meio dos jogos da seleção na Copa do Mundo, o choro é livre. Ora, homem que é homem, além possuir um enorme leque de palavrões para serem ditos na dor provocada pela derrota do time do coração, deve derramar incontáveis lágrimas pela amada.


Dia desses eu estava envolvo na fossa amorosa, mais uma de tantas. Veja bem: um lindo brotinho de calça vermelha, camisa do Vila, salto alto e cabelos preto soltos na altura do pescoço entra no bar. A cada passo dela, os fios da cabeça se remexiam. Bêbado, tive de ver as palavras que estavam na ponta de minha boca sumirem. Por longos minutos tive convicção de que estava diante de uma moça que pulou diretamente das páginas do Reinaldão Moraes, John Fante e até mesmo do puto-mor da literatura, Henry Miller. Respirei fundo, contei até dez e disse: “traz mais uma, por favor, seu Jerônimo”.


Esmeraldino, Goiás percebeu que minha fisionomia poderia tranquilamente ter saído das frases líricas de Paulo Mendes Campos. “Porra, bicho, por algum momento achei que você ia ter um troço”, comentou ele. Fitei-o e falei qualquer coisa relacionada ao fato de ser um cara sensível à beleza feminina. “Essa tua conversa fiada parece coisa de poeta romântico”, sacramentou, acendendo um cigarro e pedindo uma dose de conhaque para “lubrificar a palavra”. Morador do Criméia Leste, na região norte de Goiânia, Goiás já cometeu incontáveis maluquices na vida, o que lhe dá credibilidade para tecer os mais variados tipos de conselhos.


Em determinada altura da bebedeira, Me dê motivo, do mestre do soul brasileiro, Tim Maia, tocava no som. Neste momento, peguei meu celular, coloquei-o embaixo do alto-falante da junkebox e mandei para ela o trecho “fui jogo sujo/agora eu fujo/ pra não sofrer”. Na verdade, analisando dias depois minha atitude, consegui notar que fui um demente torrando dinheiro, fazendo planos esdrúxulos e xingando todos de filha da puta, sempre buscando esquecê-la. Um homem tomado pelo furor etílico deve arrumar alguma forma de suportar a dor, essa merda que dilacera nosso peito, que nos faz parecer uma mistura de Lord Byron com Emily Brontë pensando na pessoa que você ama e o companheiro dela às 4 da manhã, ambos felizes e sorridentes.


Era preciso, avaliei, fazer uma reavaliação completa do caso. Acendi provavelmente aquele que seria o milésimo cigarro, e bati na mesa: “a gente precisa conhecer o sobradinho, ver como é o lugar, dar umas risadas junto com as meninas”. Prontamente, fui rebatido: “sei qual é essa tua escolha, tu não me engana com esse papo aí, porra, você podia ser mais honesto, chegar na gente e dizer ‘olha, eu quero trepar com umas putas aí a noite toda’”. Não, isso não era necessariamente uma mentira deslavada, muito pelo contrário, a tal da dor faz um sujeito ter os comportamentos mais reprováveis possíveis. Mas o fator monetário me impedia de fazer uma escolha dessas, já que devo ter grana de novo sabe-se lá em que dia.


Pois bem, meu caro leitor, a casa da luz vermelha serve como antidoto aos fodidos que sentem o coração saltar do peito ou sufocar a garganta. Mas o prazer que você encontra ali é repentino e não dura mais do que as cédulas que estão em sua carteira. Talvez seja por isso que eu tenha me tornado um cara totalmente solitário, ou simplesmente porque sou considerado ‘quebrado’, operário do texto, um fracassado que cansou de levar a vida a sério na expectativa de que as coisas melhorem de agora em diante. Pode ser que sim, pode ser que não, impossível saber.


Sobre o prostíbulo: nem rola descrevê-lo aqui neste espaço. Não que eu dê muito respeito a esta coluna e às minhas colunas, mas é preciso manter as aparências à sociedade. O resto é o resto, né? Forte abraço, raro (a) leitora. Até a próxima semana, com coração um pouco melhor. Afinal, ninguém merece aguentar um cronista sentimentalmente arrasado toda a semana. Até a próxima.

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