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O que está por trás da falsa ciência “ideologia de gênero”?
Paulo Freire escreveu em Pedagogia da Autonomia “que nunca precisou o professor progressista estar tão advertido quanto hoje em face da esperteza com que a ideologia dominante insinua a neutralidade da educação. Desse ponto de vista, que é reacionário, o espaço pedagógico, neutro por excelência, é aquele em que se treinam os alunos para práticas apolíticas, como se a maneira humana de estar no mundo fosse ou pudesse ser uma maneira neutra”. Esse que é considerado o maior educador do mundo, e também uma pessoa ‘non grata’ pela academia, nunca tendo sido aceito em nenhuma universidade brasileira. É uma lástima qualquer descompasso que inventa falsas ciências e mente.
Nada mais ideológico que esse projeto de lei já desmontado, e também o movimento por uma escola sem partido, que traz jargões como marxismo cultural e ideologia de gênero, que segundo tais “profissionais”, vem para doutrinar as crianças brasileiras. Geram uma confusão deliberada entre uma categoria teórica e uma pretensa ideologia. Qual a ligação entre esses dois temas, Escola Sem Partido e “ideologia de gênero”, em momentos tão distintos? Ora, fundamentalismos conservadores que tentam passar às pessoas suas ideologias e crenças. Gramsci sustentava que a ideologia é “a concepção de mundo que se manifesta na ação e a organiza”, afinal tais movimentos se utilizam da função neutralidade, e a transmutam num motor que sustenta desigualdades. Nada é coincidência.
Esse movimento da Escola Sem Partido nasceu em 2004 e não gerou muitas preocupações, porque parecia muito absurdo e coisa pequena, mas a partir do momento que as panelas da classe média apolítica apontaram como pauta, os professores do Brasil passam por uma perigosa onda criminalizadora. O projeto desrespeita diversas normas constitucionais, violando inclusive a liberdade de cátedra, ela perpetua a escola reprodutora das desigualdades e mantém a função conservadora que reflete e reproduz as injustiças da sociedade. A escola sem partido é a escola do pensamento único, e precisa afirmar a “ideologia de gênero” para assegurar a submissão e exploração da mulher na sociedade patriarcal.
A escola que inspirou o sistema brasileiro de educação pública surgiu na Revolução Francesa, como parte essencial do projeto iluminista, ou seja, uma escola que asseguraria que o filho da gente comum também pudesse estudar, e infelizmente, devido ao seu caráter burguês, também determinava qual conhecimento era válido e qual não era. A organização da sala de aula é herança bem exemplificativa, emancipação circunscrita pelo autoritarismo, e também denunciada por Paulo Freire, nosso legado colonial, uma vez também, que a escola pública hoje é o quarto de despejo da criança de baixa renda. É para essas crianças que é preciso assegurar a proibição da escola sem gênero, afinal a escola empoderadora deve ser mantida longe da classe trabalhadora, e disponível por cinco mil reais por mês em média, para os filhos dos colonizadores.
Discutimos essa importantíssima pauta pois mais uma vez, o maior jornal do estado faz o desserviço da desinformação mascarada de opinião. Onde por exemplo, uma 'especialista' em docência universitária afirma que a comunidade LGBT não entende nada de ideologia de gênero e que tal ideologia é um plano da UNICEF para o controle populacional mundial. O que de tão patético parece irreal, são as palavras de Waldineia Ladislau, publicadas em artigo no O Popular no dia de hoje (12 de junho).
A função social de um jornal deveria ser informar as pessoas da realidade e não simplesmente disseminar ódio através de falsas informações. A grande real é que a cada 19 horas uma pessoa LGBT é assassinada ou comete suicídio por 'LBGTfobia', ensinar questões de gênero nas escolas ajuda a transformar um país LGBTfobico em um lugar seguro para essas pessoas. Não explicar sobre a importância do assunto e ainda por cima continuar publicando sobre como isso vai "destruir" a família brasileira é o cumulo do absurdo.