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  • Foto do escritorMarcus Vinícius Beck

Militar, ecrever e publicar

Festa Literária

Organizada pelo Coletivo Metamorfose, festa tem como propósito levantar fundos para financiar publicações independentes. Evento começa a partir das 17h

Contracultura, 1968... O escritor norte-americano Tom Wolfe (1930-2005) ingeriu uma dose de LSD com o objetivo de compreender as manifestações que questionavam o status quo. Como resultado dessa peregrinação nas profundezas da contestação social, o célebre jornalista descreveu detalhadamente no livro O teste do ácido do refresco elétrico (1968) o psicodelismo, a rebeldia hippie, o idealismo da revolução cultural... Wolfe saiu à caça de uma história aos moldes do Novo Jornalismo (vertente literária que rompeu com padrões ligados à produção jornalística convencional) e deparou-se com um retrato visceral dos anos de 1960.


Ponto, parágrafo... estamos na década de 2010, em Goiânia, no coração do Brasil. Estudantes secundaristas puxaram protestos contra o Projeto de Emenda Constitucional (PEC) 241, mais conhecido como “PEC da Mordaça”, que previa congelamento de gastos por 20 anos em educação e saúde. A insurreição ficara conhecida como Primavera Estudantil e estendeu-se do início de outubro a meados de novembro de 2016. Acadêmico de jornalismo da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-GO), participei da ocupação da Rádio Universitária da Universidade Federal de Goiás e, a partir da experiência que tive, escrevi um livro reportagem.


Na verdade, parafraseando o criador do Jornalismo Gonzo, doutor Hunter Thompson (1937-2005), a obra Diário Subversivo: dias de embriaguez, utopia e tesão (sobre a qual falarei hoje na roda de conversa) era para ser algo completamente diferente de tudo o que já foi feito na imprensa goiana. Pode parecer pedantismo de minha parte, mas reconheço que nada daquilo precisava ser escrito da forma que foi. Não era para ser a representação de uma derrota deflagrada pelo Poder Judiciário. Não. Eu pretendia registrar a coisa no momento em que ela acontecia, fazendo com que o texto fluísse e servisse como documento histórico para as próximas gerações.


Bem, passo a bola para minha companheira de subversão intelectual... Autora do documentário Primavera Estudantil (2016), a documentarista e fotógrafa Júlia Lee, 22, não enxerga os onze dias de embriaguez, utopia e tesão de forma negativa. “Foi uma experiência maravilhosa e, por isso, a gente está organizando esse evento. Nosso objetivo é lançar o livro reportagem sobre a Rádio Libertária, além de viabilizar que outros projetos circulem entre o público”, afirma a fotógrafa, que também é uma das personagens do livro reportagem gonzo Diário Subversivo: dias de embriaguez, utopia e tesão. “Esperamos que todos os fãs de literatura prestigiem nosso rolê”.

“Nosso objetivo é lançar o livro reportagem sobre a Rádio Libertária, além de viabilizar que outros projetos circulem entre o público, como o Jornal Metamorfose” - Júlia Lee, fotógrafa

Apesar desse fracasso que cismo em reverenciar, a roda de conversa que o Coletivo Metamorfose organiza não será composta apenas por derrotados. A artista visual Ilâine Nunes vai falar sobre o processo criativo para seu foto-livro Fronteiras. Fruto de trabalho de conclusão de curso da Faculdade de Artes Visuais (FAV) da UFG, a narrativa visual retrata as fronteiras que permeiam a identidade periférica entre Goiânia e Aparecida de Goiânia. “A narrativa reúne fotografias e recortes de entrevistas de seis mulheres moradoras da região do Setor Garavelo, mostrando pontos comuns e de diferenças em suas histórias”, conta ela.


Escultura e Produções Editoriais


Sócio da editora Escultura e Produções Editoriais, que tem sede na Casa Liberté, no Setor Central, o jornalista, ilustrador e agitador cultural Heitor Vilela, 24, também participará da roda de conversa onde falará sobre as dificuldades em publicar obras underground e independentes. “Apesar de ser mais democrático do que em tempos passados, ainda é um processo extremamente caro colocar um material em uma gráfica, fazê-lo circular de forma ampla”, diz ele, que é o autor da capa do livro reportagem Diário Subversivo: dias de embriaguez, utopia e tesão.


Voltemos um pouco no tempo: a primeira publicação da Escultura foi o livro Estado de Exceção Escolar, lançada em 2016 e parte da Coleção Piquete. A obra trata-se de um apanhado de análises de renomados pesquisadores das ciências sociais, além de possuir uma ampla entrevista com ex-estudante de colégio militar, entremeados por artes gráficas referentes ao tema tratado. “A ideia de organizar o coletivo editorial surgiu da necessidade de publicarmos um livro no contexto da tentativa do governo estadual de ampliar o projeto de militarização escolar, ao qual nos opúnhamos”, diz.


Em entrevista ao DM Revista concedida no ano passado, o cientista social Ian Caetano disse que a ideia de fazer uma editora nasceu da necessidade de publicar obras que não tem tanto espaço no mercado editorial. “Queremos dar vasão a produções que julgamos, por razões diversas, excluídas do grande mercado editorial, mas nas quais vemos grande potencial, seja artístico, seja intelectual. Igualmente, a ideia é abrir espaço a publicações que sejam inovadoras, pioneiras”, afirmou ele, na ocasião.


“A ideia é talvez publicar autores menos destacados, mas que julgamos com fortes contribuições no campo das artes, literatura e teoria (marcadamente no campo da esquerda) e, na medida em que formos conseguindo, ir organizando eventos e lançamentos destes projetos para fomentar o debate e a circulação destas obras”, finaliza o estudioso, que é doutorando em Ciência Política pelo Instituto de Estudos Sociais e Políticos (IESP).

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