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  • Foto do escritorMarcus Vinícius Beck

O velho safado e as mulheres

Resenha

“Eu tinha cinquenta anos e há quatro não ia pra cama com nenhuma mulher”. Esse é Henry Chinaski, poeta, bêbado, amante de música clássica e alter-ego do escritor norte-americano Charles Bukowski (1920-1994). Opa… tirem as crianças da sala, pois este é um daqueles livros que devem ficar nas prateleiras mais altas das livrarias. Com seu olhar ácido e ferino, o velho safado mostra em suas obras o mundo como ele é. Mais dos desajustados (maioria reinante em nossa sociedade) do que os perfis “certinhos” vendidos nas propagandas de margarina.


Se a literatura tivesse classificação indicativa como há nos filmes, a maior parte dos livros do dirty old man seriam destinados para maiores de 16 anos, e Mulheres (1978) para maiores de 18. O tema sexo e violência permeia todo o romance. Fã do escritor John Fante (1909-1983), autor do romance Pergunte ao (1939), Bukowski escreve sobre nossas angústias, fazendo um retrato do cativeiro em que estamos submersos. Por isso, a prosa dele gira em torno de sexo e embriaguez. Símbolo da anestesia, a cerveja nos dá uma sensação de libertação, enquanto a transa evidencia o prazer num mundo robótico.


O mais impressionante é que Bukowski traça um retrato assustador da classe trabalhadora. Vale lembrar que seus textos foram escritos entre as décadas de 1950 e 1990, mas ainda permanecem assustadoramente atuais. Assim, ao ler o cronista da desgraça social, fomos tomados por um sentimento de que as coisas estão degringolando numa velocidade estonteante. Sim, o escritor provoca no leitor uma dúvida ferrenha em relação ao futuro, à loucura que nos impõem na correria do dia a dia e todos esses pedregulhos.


Após uma crítica de uma de suas mulheres, Chinaski escreve:

“Eu era uma soma de todos os erros: bebia, era preguiçoso, não tinha um deus, idéias, ideais, nem me preocupava com política. Eu estava ancorado no nada, uma espécie de não ser. E aceitava isso. Eu estava longe de ser uma pessoa interessante. Não queria ser uma pessoa interessante; dava muito trabalho. Eu queria mesmo era um espaço sossegado e obscuro para viver minha solidão. Por outro lado, de porre, eu abria o berreiro, pirava, queria tudo e não conseguia nada. Um tipo de comportamento não casava com o outro. Pouco importava.” P. 113


Bem, meu caro leitor (a), agora vamos ao que de fato interessa nesta resenha. Mulheres é uma saga, ora intensa, ora descompromissada, mas sempre interessante, de Chinaski com diversas mulheres. No contexto apresentado na obra, elas sentem-se entusiasmadas em procurá-lo, querendo conhecer aquele cara que escreve com muito sentimento, que tem a habilidade de usar as palavras para semear carinho, que é um personagem icônico em leituras de poesia pelas universidades dos Estados Unidos. Talvez elas quisessem se ver eternizadas nos versos do protagonista (que possui grandes semelhanças com o autor).


Rotulado como obsceno, Bukowski não poupa palavras fortes, nem situações inusitadas no decorrer do romance. Ele escreve sobre a vida de forma lírica e coloquial, evocando mais uma vez o legado do romancista estadunidense Ernest Hemingway (1899-1961), prêmio Pulitzer de Ficção em 1953 e Nobel de Literatura em 1954, que diz que um bom escritor evita usar advérbios e adjetivos.


A mensagem bukowskiana é para os excluídos, para os inconformados, para os loucos, àqueles que sabem que poucas coisas - ou nada - valem a pena na vida. Bem-vindo, Chinaski é um poeta que começa a ser reconhecido pelos seus poemas. Então, ele passa a colocar em prática todas as fantasias sexuais que lhe foram reprimidas na adolescência e juventude. Várias mulheres entraram na vida dele. E saem. E houve choros. E lágrimas escorreram das frases diretas e objetivas do mestre Buk.


Durante uma entrevista, na década de 1980, Bukowski foi questionado sobre Mulheres ser um livro machista. Com estilo, disse: “Você não lembra da parte em que eu sento na cama e choro?”, respondeu, fazendo alusão a cena em que ficou em dúvida com qual delas passaria as festividades de final de ano. Portanto, Mulheres é a essência da literatura bukowskiana. Com o velho Chinaski, Buk fala para aqueles que se sentem à margem. “Ficção é a vida melhorada”, diz o dirty old man.


"Mulheres"

Autor: Charles Bukowski

Editora: L&PM Pocket

Páginas: 304

Quanto: R$ 24,90 (no site da editora)

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