Marcus Vinícius Beck
Produções goianas agitam Mostra de Tiradentes
Cinema
Entre os dias 18 e 28 de janeiro cidade de Tiradentes recebe críticos, jornalistas e cineastas para Mostra de Cinema de Tiradentes. Seis filmes goianos vão ser exibidos

Foto: Divulgação
Nosso filme está fazendo uma carreira muito bonita, mas a gente não está na Mostra Aurora porque o longa-metragem não é inédito - Fabiana Assis, cineasta autora do documentário Parque Oeste
O Festival de Cinema de Tiradentes terá pontapé inicial na próxima sexta-feira (18) e seis filmes goianos (que variam entre produções de curta e longa-metragem) vão ser exibidos na histórica cidade mineira. Na Mostra Aurora, o principal critério de escolha se baseia na quantidade de longas-metragens no currículo do cineasta que assina a obra, que deve ser no máximo até três. Já a Mostra Olhos Livres reúne seis longas que possuem semelhanças estéticas, desprendendo-se de compromissos vinculados ao mercado e utilizando-se recursos criativos de linguagem cinematográfica.
Com produção e direção de Fabiana Assis, o documentário goiano Parque Oeste (70', 2018) estreou em setembro do ano passado no Festival de Brasília e narra a história de uma mulher que busca reconstruir sua vida depois da violenta desocupação ocorrida no Setor Parque Oeste, em 2004. Em entrevista exclusiva ao Jornal Metamorfose concedida na última sexta-feira (11), a cineasta disse que o festival possui grande relevância para o cinema brasileiro porque foge da regionalização promovida pelo eixo Rio-São Paulo, tendo papel fundamental para a revelação de novos cineastas.
“Nosso filme está fazendo uma carreira muito bonita, mas a gente não está na Mostra Aurora porque o longa-metragem não é inédito. Mesmo assim, a Mostra Olhos Livres é bastante bonita e competitiva”, conta Assis. “Parque Oeste mostra a história da desocupação do Setor Parque Oeste que oficialmente teve um saldo de dois mortos, porém o pessoal que estava lá fala em mais. O filme mescla imagens desse dia (são imagens fortes, a gente vê bala passando, a opressão do Estado). Também temos imagens da vida dessas famílias já no Setor Real Conquista, que é um bairro cheio de problemas”.
Assis afirmou ainda que o propósito do documentário não é somente denunciar as negligências por parte do Estado, mas sim lembrar que a desocupação do Setor Parque Oeste quase não é falada em Goiás. De acordo com a diretora, o filme cumpre um papel central no sentido de manter vivo na memória da população um dos períodos mais trágicos da história da capital goianiense. “É um filme que mostra que é possível dar a volta por cima. Quando quis fazer o longa, pensei em passar essa mensagem”, finaliza Assis.
Nós imaginamos que vai haver um bom público, pois a exibição de Guará será na praça - Fabrício Cordeiro, cineasta autor do curta-metragem Guará
Com exibições ao ar livre, a Mostra Praça vai contar com o curta-metragem goiano Guará, dos cineastas Fabrício Cordeiro e Luciano Evangelista. Durante conversa com o Metamorfose, Cordeiro lembrou a importância da mostra para a cena do audiovisual nacional e disse que participar do festival com curta-metragem é relevante, já que esse tipo de filme tem pouco apelo comercial. “Nós imaginamos que vai haver um bom público, pois a exibição de Guará será na praça. A mostra é toda gratuita e, como será ao ar livre, as pessoas transitam entre o Centro Histórico de Tiradentes com a possibilidade de ver o que está passando na tela”, explica o diretor.
Outras produções goianas, como O Cego da Casa Amarela, Além dos Muros e A Natureza Agradecem, também estão com presença garantida na 22° edição da Mostra de Cinema de Tiradentes. Além dessas obras, o longa-metragem Vermelha (Ficção, Cor, Digital, 78 min, GO, 2019) é um dos filmes que foram selecionados para a Mostra Aurora. Com direção e roteiro assinado por Getúlio Ribeiro, produção executiva de Cecília Brito e fotografia de Larry Machado, o longa mostra dois homens que viajam à zona rural em busca de uma antiga raiz que foi atingida por um raio.
Diversidade

Cena do filme Guará. Foto: Divulgação
O curta-metragem segue com presença de honra na Mostra de Cinema de Tiradentes. Ao todo, o evento terá 78 produções de 13 estados do País. Para o professor de cinema da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e um dos curadores da mostra de Tiradentes, os filmes que foram selecionados para essa edição estão marcados pelos acontecimentos da política brasileira. “É possível detectar certo estado de coisas a partir de dois aspectos. De um lado, uma total letargia dos protagonistas a partir do que vem acontecendo no Brasil, num misto de lamúria, lamentação, ensimesmamento, depressão e de uma vontade de compartilhar afetos”, diz.
Outro ponto que merece destaque na Mostra de Tiradentes é a diversidade. Para a curadora Tatiana Carvalho Costa, o conjunto de filmes que foram escolhidos possuem multiplicidade de olhares para uma diversidade de sujeitos. “Sujeitos historicamente silenciados tomam para si não só a palavra, mas a forma de enunciação, em gestos corajosos e potentes de elaborações narrativas”, afirma ela. “Destaco, no conjunto, os filmes dirigidos por pessoas trans/travestis e pessoas negras. Seja por meio da ressignificação de elementos clássicos da narrativa cinematográfica ou pela proposta de dispositivos quase disruptivos”.
Pela primeira vez, a Mostra submeteu aos inscritos na categoria curta-metragem a um questionário para a coleta de informações gerais. De acordo com dados compilados pela curadoria, 63 mulheres negras foram creditadas como diretoras de filmes inscritos. Deste total, 43 foram exclusivamente dirigidos por elas, enquanto os outros 20 eram co-assinados por diretor homem. Já em relação a identidade sexual, das 63 diretoras, 3 se diziam lésbicas. Em dados de gênero e identidade sexual, são 32 homens cis, 19 mulheres cis, 1 mulher trans, 1 homem trans, 1 travesti, 1 pessoa não binária, 1 pessoa de gênero não definido.