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A poesia em Eduardo Galeano

Literatura


Conhecido pelo seu humor corrosivo, jornalista retorna ao mercado editorial em novo livro que deve ser lançado pela L&PM em março



Galeano é autor obrigatório para compreender a América Latina - FOTO: Eugênio Mazzinghi/Reprodução


Marcus Vinícius Beck


A vasta obra do jornalista e escritor uruguaio Eduardo Galeano (1940-2015) passa pela história, ficção, poesia, jornalismo, análise política, futebol e o que mais lhe desse na telha. E, é importante dizer, tudo isso sempre narrado pela ótica dos oprimidos, dos excluídos, daqueles que não têm voz: Galeano relatou poeticamente a trajetória do craque argentino Diego Armando Maradona, reconstituiu a história da América Latina e falou sobre a tentativa dramática do cronista carioca Nelson Rodrigues em conquistar a mulher da sua vida.


É com um desses homens, de esquerda, meio poeta, meio repórter, que a intelectualidade de um continente é redimida. Com seus textos, sempre apaixonados, e com suas entrevistas, bastante eloquentes, a história de exploração da América Latina passou a ser documentada. Galeano foi responsável ainda pela invenção de um gênero composto por pequenas narrativas episódicas, discretíssimas, que não precisam mais do que uma página (de livro de bolso!) para falar sobre fatos aparentemente desinteressantes. E sempre com um humor corrosivo.



Da esquerda à direita: Maradona e Nelson Rodrigues, que Galeano escreveu sobre ambos - Fotos: Reprodução



Previsto pelo ser lançado pelo selo L&PM na primeira semana do mês que vem, o livro “Espelhos - Uma História Quase Universal” analisa a história da humanidade - de sua origem até os dias de hoje - a partir da perspectiva dos desvalidos e dos esquecidos pela historiografia oficial. Com um tom de crônica poética, a obra traça um panorama dos principais acontecimentos do mundo, e mistura o passado com o presidente. Ao todo, são aproximadamente 600 histórias breves que proporcionam uma viagem ao tempo sem limites.


“Este livro foi escrito para que eles não se percam. Nestas páginas se unem o passado e o presente. Os mortos renascem, os anônimos têm nomes: os homens que construíram os palácios e templos de seus amos; as mulheres, ignoradas por aqueles que ignoram os próprios temores”, escreve Galeano, em trecho da obra, acrescentando: “ o sul e o oriente do mundo, desprezados por aqueles que desprezam as próprias ignorâncias; os muitos mundos que o mundo contém e esconde; os pensadores e sentidos”, completa.


Além disso, “Espelhos” aborda com elegância usando o mínimo possível de palavras episódios que marcaram a vida política do mundo nas últimas décadas e, é claro, em se tratando de Galeano, não podia faltar a história da América Latina. “Certa manhã, políticos monarquistas acordaram republicanos. Dois anos depois, a constituição estabeleceu o sufrágio universal. Todo mundo poderia votar, menos as mulheres e os analfabetos. Como quase todos os brasileiros eram ou mulheres ou analfabetos, praticamente ninguém votou.”



Obra de Galeano passeia pelos mais diversos gêneros literários - Foto: Reprodução


Resistência


Nascido no dia 3 de setembro de 1940 em Montevidéu, o escritor Eduardo Galeano começou no jornalismo na década de 1960, como chefe de redação e diretor dos jornais Marcha e Época. Em 1971, Galeano publicou o livro-reportagem “As Veias Abertas das América Latina”, obra que se tornaria referência para compreender as mazelas sociais do Continente. Clássico do jornalismo e da historiografia, o livro analisa a formação da América Latina desde sua colonização e como essa região rica foi à ruína pelas explorações dos europeus.


“Nossa derrota esteve sempre implícita na vitória alheia. Nossa riqueza gerou sempre nossa pobreza para alimentar a prosperidade dos outros: os impérios e seus agentes nativos”, dizia o escritor, em suas entrevistas. Segundo Galeano, o fato das classes mais abastadas da sociedade viverem bem é um sintoma de que as multidões estarão condenadas “a uma vida de bestas de carga”. “O bem-estar das classes dominantes - dominantes para dentro, dominados para fora - é a maldição de nossas multidões, condenadas a uma vida de bestas de carga”.



O sanguinário ditador argentino Jorge Videla - Foto: Reprodução


Após a consolidação do golpe civil e militar no Uruguai, em 1973, o jornalista foi preso e, ao sair do xilindró, buscou exílio na Argentina. Na terra de Júlio Cortázar, dirigiu a revista Crisis, que tinha uma linha editorial voltada para a cobertura de assuntos políticos e culturais. Em 1976, com medo da repressão do regime de Jorge Videla, Galeano se mudou para a Espanha. Uma vez no Velho Mundo, começou a escrever a trilogia “Memória de Fogo” e os livros “Os Nascimentos, As Caras e As Máscaras” e “O Século do Vento”.


Considerado um dos maiores escritores da história da literatura latino-americana, Eduardo Galeano fez aquilo que ninguém se propôs a fazer: colocou no centro de suas histórias pessoas - para parafrasear o cantor Chico Buarque - que não costumam ter suas dores expostas nos meios de comunicação e são menosprezadas pela historiografia. Galerano, portanto, é um sopro de sensibilidade em tempos truculentos onde o que mais existe são histórias irreais tidas como reais. Nunca se fez tão necessário a leitura desse mestre.


Ficha Técnica

‘Espelhos - Uma História Quase Universal’

Autor: Eduardo Galeano

Gênero: Crônica

Editora: L&PM

Preço: R$ 35,90



Entrevista de Galeano para o programa "Sangue Latino", do Canal Brasil - Imagem: Reprodução/ Canal Brasil

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