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Brigas ideológicas afastam movimento estudantil de luta contra cortes

Educação

Com desmonte da educação pública, feito pelo presidente Jair Bolsonaro nos últimos meses, movimento estudantil não consegue se mobilizar

Foto do protesto contra os cortes no dia 15 de maio de 2019, feita por Júlia Lee


Com a entrada do presidente de extrema-direita Jair Bolsonaro ao poder no início do ano, o movimento estudantil voltou a se mobilizar ativamente sobre pautas contra o fascismo, levantando, assim, uma discussão acadêmica sobre a radicalização da direita no país.


No dia 30 de abril, o Ministro da Educação, Abraham Weintraub, anunciou um corte de 30% no orçamento das universidades federais, afirmando em entrevista para o jornal O Estado de S. Paulo que "universidades que, em vez de procurar melhorar o desempenho acadêmico, estiverem fazendo balbúrdia terão verbas reduzidas”. Logo após o pronunciamento do Ministério da Educação (MEC), o movimento estudantil se mobilizou com os professores e diversos segmentos da sociedade para lutar contra o desmonte na educação, o que se resultou em protestos em mais de 200 cidades no mês de maio.


Os protestos mobilizaram diversos segmentos do movimento estudantil, como os anarquistas autônomos, a União Nacional dos Estudantes (UNE), União da Juventude Socialista (UJS), União da Juventude Comunista (UJC), Correnteza entre outros. Apesar das mobilizações em todo país, o movimento pela educação não conseguiu se unificar realmente pela pauta, o que não é novidade dentro do nosso contexto político.


Recentemente, no dia 18 de julho, com o anúncio do programa Future-se, que visa realizar uma reforma administrativa nas universidades públicas, que hoje são de autarquias - ou seja, instituições subordinadas ao regime jurídico de direito público, o que dá ampla autogestão para as universidades. O Futura-se irá implementar políticas de cobrança de mensalidades, e mudará a contratação de professores e funcionários para um regime celetista e de contratos temporários.


Após o pronunciamento da reforma administrativa, a UNE (União Nacional dos Estudantes) marcou um ato para o próximo dia 13 de agosto, que até então não se sabe se terá adesão de outras vertentes do movimento estudantil e sindical.


UNE e CONUNE


As adversidades políticas brasileiras são comumente enfrentadas pela juventude que se arrisca a lutar pelo que acredita. A UNE (União Nacional dos Estudantes) é uma das organizações que já participaram no conflito contra os retrocessos que são frequentemente destinados à população por uma elite política e econômica que ousa ferir o trabalhador e a educação.


O Conune é o congresso da UNE que funciona como um fórum decisório para que os estudantes determinem o rumo do movimento estudantil nos próximos dois anos. No último dia 11 de julho, em Brasília, ocorreu o 57º Conune que reuniu as organizações estudantis que se organizam abaixo da UNE, sendo assim a entidade máxima dessas instituições. No último dia do evento foi eleita a diretoria que estaria a frente do gerenciamento dos dois próximos anos.


Essa eleição é sempre coberta de embates entre as organizações estudantis, o que de certa forma já é esperado, pois, isso não é nada mais do que um dos frutos do sistema que acentua a relevância do poder. Entretanto, dentro desse cenário diversas acusações são realizadas, a maior delas se concentra no argumento de aparelhamento da UNE pela UJS (União da Juventude Socialista). Eleições fraudadas e delegados ilegítimos são queixas frequentes após o 57º Conune.


Foto do #15M, por Júlia Lee


Segundo o atual presidente da UNE, Iago Montalvão que é estudante de economia da Universidade de São Paulo (USP), tem 26 anos e militante da UJS, existe um "amadurecimento" dos movimentos que hoje conseguem se unir contra os cortes.


"Não acho que haja uma fragmentação entre as organizações estudantis, pelo contrário há uma unificação porque organizações diferentes, de opiniões diferentes, sempre existiram não só no Brasil mas no mundo inteiro. Eu acho que pelo contrário há uma unificação e o melhor exemplo disso é o que aconteceu nesse último congresso com o retorno do PSTU a UNE, e você vê uma UNE tão diversa com tantos movimentos, mas todos ali participando do congresso, reconhecendo a UNE como uma entidade onde se pode encontrar mobilização do movimento estudantil", afirma Iago Montalvão, presidente da UNE.


As críticas contra a UNE não são recentes, como explica a militante da UJC (União da Juventude Comunista) Andriele Qualhato, de 24 anos e estudante de Medicina Veterinária pela UFG. "Nos governos petistas a UNE perde seu papel histórico para virar correia de transmissão dos governos PT. Com toda sua diretoria vinculada aos gabinetes do governo e não fazia mais as lutas na base. Passava grande parte nas negociatas e foi perdendo base. Ao ponto de hoje a maioria dos estudantes não conhecer a UNE e achar que é uma entidade que só fábrica carteirinhas", diz Andriele.


ENEPe e mobilização dos estudantes de pedagogia


O ENEPe é o Encontro Nacional dos Estudantes de Pedagogia, que está na sua 39ª edição, sendo construído historicamente de forma "democrático pela base", ou seja, através de votações e assembléias que visam construir uma organização que inclua a todos que participam do evento. O encontro é composto por estudantes de pedagogia e apoiadores (pós-graduandos e trabalhadores da área), com o intuito de fomentar o debate para construir a luta por uma educação a serviço do povo.


Assim como em quase todas as vertentes do movimento estudantil, entre entidades e organizações, ocorreu um aparelhamento da luta. Entre 2004 e 2006 houve um rompimento nacional com a UNE, pois naquele momento havia um projeto dentro do MEC sobre as diretrizes curriculares da pedagogia. Esse projeto desprezava a formação unitária do pedagogo desassociando a pesquisa da docência e da gestão, sendo elaborado assim um viés muito próximo do tecnicismo com uma atuação restrita ao ensino infantil e nos anos iniciais.


Nesse contexto, a União Nacional dos Estudantes (UNE) estava articulando com o ministro na época, Fernando Haddad, para realizar os interesses daquele governo. Essa relação da UNE com o ministro acarretou em uma desmobilização dos estudantes contra o projeto que o MEC queria implementar.


Graças a isso, aquele era o momento propício para que o movimento estudantil de pedagogia começasse a pensar a sua organização de uma maneira distante da UNE, ou seja, de uma forma não eleitoreira nem oportunista. Em seguida esse mesmo agrupamento se aproximou das organizações combativas como a RECC (Rede Estudantil Classista e Combativa) e o MEPR (Movimento Estudantil Popular Revolucionário).


Foto: Júlia Lee


Em 2018, o ENEPe (Encontro Nacional dos Estudantes de Pedagogia) sofreu com novos rompimentos e, de acordo com a militante e estudante de pedagogia Alice (nome fictício pois a fonte teme pela exposição política), houve um rompimento com o MEPR, pois ocorreu um gradual nível de "desrespeito e centralização" para com os estudantes de outras entidades e organizações.


"Chegou um momento em que o MEPR não foi capaz de aceitar a perda da sede da plenária final de Petrolina por mais de 150 votos e assim agiram de forma golpista para construir outros encontros que atendessem seus interesses. A falta de respeito era de tal tamanho, tendo um autoritarismo forte que eram características frequentes no momento. As disputas sadias e as boas relações existiam até o congresso de 2015, até então havia diálogo entre todas as organizações ali presentes", relata Alice, militante e estudante de pedagogia.


O rompimento do MEPR com o ENEPe se resultou em um encontro paralelo, aclamado como "fake" por militantes da RECC (Rede Estudantil Classista e Combativa). Segundo nota oficial, lançada em maio deste ano no site da UNIFESP - Guarulhos, "o campus sediará, entre os dias 22 e 26 de julho, o 39º Encontro Nacional de Pedagogia (ENEPe)".


O evento "oficial" dos estudantes de pedagogia, divulgado pela organização dos eventos anteriores, acontecerá entre os dias 22 e 26 de julho, em Goiânia.


Luta pela educação


Foto: Júlia Lee


Os conflitos internos que ocorrem dentro dos movimentos estudantis, historicamente, acabam acarretando em um movimento pela educação que é fragmentado, não havendo grandes possibilidades de diálogo.


Com os últimos pronunciamentos do presidente Jair bolsonaro (PSL), no dia 18 de julho, sobre a cobrança de mensalidade nas Universidades Federais, há a eminente necessidade de uma mobilização contra o desmonte da educação pública.


"Esse tipo de conflito gera o afastamento dos estudantes, além do adoecimento e o desgaste, afinal é necessário uma reflexão. Ainda sim, essa conjuntura não permite esmorecer e enfraquecer, já que o movimento estudantil de pedagogia precisa se opor aos desmanches do governo", afirma Alice, estudante de pedagogia.

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