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Covid-19 se espalha em terra Yanomami

Meio Ambiente

Pandemia chega à comunidades indígenas através do garimpo ilegal

Invasão de garimpeiros na Terra Indígena Yanomami. Chico Batata / Greenpeace


Júlia Aguiar


A sociedade ocidental mantém a dívida histórica de uma guerra que nunca acabou. São mais de 500 anos de conflito, onde milhões de indígenas morreram, milhares de comunidades desapareceram, culturas perdidas no tempo e as relações danosas com a Terra são mantidas vigentes pelos brancos capitalistas. Estamos enfrentando uma morte coletiva derivada da pandemia do novo coronavírus, e continuamos a assistir os povos originários serem massacrados cotidianamente.


Há décadas o território Yanomami sofre com a exploração, afinal, é o maior território indígena do país contendo uma reserva florestal imensurável para o equilíbrio das floresta amazônica. “Meu povo tem o direito de viver em paz e em boa saúde, porque ele vive em sua própria casa. Na floresta estamos em casa! Os Brancos não podem destruir nossa casa, senão, tudo isso não vai terminar bem para o mundo”, alertava o líder indígena Davi Kopenawa Yanomami no começo de março, em Genebra, na audiência da Comissão de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU).


Segundo o relatório de 2019 do Instituto Socioambiental (ISA), desde o começo do governo de Jair Bolsonaro (sem partido) o desmatamento em terras indígenas na Amazônia cresceu em 113%, impactando diretamente seis territórios que possuem registro de dez povos indígenas que vivem isoladamente, correspondendo à 90% do território desmatado. “Os povos indígenas isolados são populações que, para sobreviver ao contato promovido pelo homem branco, refugiam-se no interior das florestas e vivem em isolamento total ou sem contato significativo com a sociedade nacional. Doenças, violência física, espoliação de recursos naturais e outras agressões dizimaram populações inteiras no passado. Hoje, são 115 registros de grupos indígenas isolados no Brasil, 28 deles confirmados”, afirma o relatório do ISA entregue à ONU em março deste ano.


Estamos em meados de julho, e a campanha “Fora Garimpo, Fora Covid” promovida pelo Instituto Socioambiental com o apoio da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB), Instituto Socioambiental (ISA), Survival International, Greenpeace Brasil, Conectas Direitos Humanos, Anistia International, Rede de Cooperação Amazônica (RCA), Instituto Igarapé, Fundação Rainforest Noruega, Fundação Rainforest EUA, já conta com 340.995 mil assinaturas, precisando cerca de 9.000 assinaturas para que a petição seja entregue às autoridades.


Assine a campanha: https://foragarimpoforacovid.org/#

Segundo a campanha, as comunidades mais próximas às zonas garimpeiras já registram um aumento de 30% no contágio, comparado com os dados do estado de Roraima, um dos mais infectados no Brasil. Em Waikás, região com o maior índice de garimpo de todas as Terras Indígenas no país, são 38 indígenas contaminados com covid-19 em uma comunidade com 179 índios Ye’kwana. Desde maio, o Instituto Socioambiental observa um aumento do fluxo de garimpeiros entre a cidade e interior das reservas ambientais, segundo a pesquisa são cerca de cinco barcos atravessando os rios diariamente, além de um fluxo diário de helicópteros e aeronaves. “Os garimpeiros dispõem de grande infraestrutura tecnológica e de transporte, barcos e aviões, telefone e internet via satélite. Tudo isso funcionando ilegalmente e contrastando com a completa ausência do governo”, afirma a campanha.


Assista ao vídeo de divulgação da campanha #ForaGarimpoForaCovid


Segundo relatório divulgado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) no último dia 10, o aumento do desmatamento da Amazônia brasileira cresce pelo 14º mês consecutivo. Já são 3.069,57 km² de área desmatada, o que é equivalente a duas vezes a área da cidade de São Paulo - que é a maior metrópole da América Latina.


Caro leitor, lembra daquela reunião ministerial, divulgada amplamente na mídia, em que o Ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles afirma: “Precisa ter um esforço nosso aqui enquanto estamos neste momento de tranquilidade no aspecto de cobertura da imprensa, porque só se fala de covid-19, e ir passando a boiada e mudando todo o regramento e simplificando normas. De Iphan, Ministério da Agricultura, de Ministério do Meio Ambiente, de ministério disso, de ministério daquilo”. Pois é.


No dia 6 de julho, o Ministério Público Federal (MPF) entrou com ação de improbidade administrativa contra Ricardo Salles, doze procuradores da República se uniram para pedir o afastamento do ministro em caráter urgente, pedindo inclusive condenação nas penas previstas por lei, que seriam perda da função pública, suspensão dos direitos políticos, pagamento de multa e proibição de receber benefícios e incentivos fiscais do poder público. Na ação, o MPF justifica que o Ministro do Meio Ambiente promoveu a desmonte de políticas ambientais e que favoreceu interesses que são contrários ao Ministério que ocupa.


Segundo documento divulgado no site do Ministério Público, requerente à ação judicial, “é possível identificar, nas medidas adotadas, o alinhamento a um conjunto de atos que atendem, sem qualquer justificativa, a uma lógica totalmente contrária ao dever estatal de implementação dos direitos ambientais, o que se faz bastante explícito, por exemplo, na exoneração de servidores logo após uma fiscalização ambiental bem sucedida em um dos pontos críticos do desmatamento na Amazônia Legal”.


Como impedir um massacre à população indígena, quando o órgão que deveria regulamentar e fiscalizar ações que protejam as florestas e índios brasileiros age em prol de retaliações contra funcionários da pasta e órgãos interligados que simplesmente estão cumprindo o seu papel? Para o Ministério Público Federal, “as declarações apenas expõem, de forma clara, o que diversos atos já confirmavam: existe um verdadeiro encadeamento premeditado de atuar contrário à proteção ambiental, caracterizando o dolo, elemento subjetivo dos atos de improbidade. Analisando os fatos concretos, desde o início de sua gestão à frente do MMA, o ministro tem adotado inúmeras iniciativas em flagrante violação ao dever de tutela do meio ambiente, como a desconsideração de normas, critérios científicos e técnicos, em desrespeito aos princípios ambientais da precaução, da prevenção e da vedação do retrocesso”, afirma o MPF.


Já no último dia 8, o Ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que o Governo Federal adotasse uma série de medidas para conter a disseminação do novo coronavírus às comunidades indígenas. Segundo o documento aprovado, as medidas passam pelo planejamento com a participação das comunidades indígenas, ações para contenção de invasores em reservas e criação de barreiras sanitárias no caso de indígenas em isolamento, acesso de todos os indígenas ao Subsistema Indígena de Saúde e elaboração de plano para enfrentamento e monitoramento da Covid-19.



A ação foi apresentada ao STF pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) e seis partidos políticos (PSB, PSOL, PCdoB, Rede, PT, PDT). Segundo Barroso, ele procurou atuar no caso como "facilitador de decisões e de medidas que idealmente devem envolver diálogos com o poder público e com os povos indígenas, sem se descuidar, contudo, dos princípios da precaução e da prevenção", diz ministro ao site do Supremo Tribunal Federal.

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