Marcus Vinícius Beck
El diéz
Botequim Literário

Maradona faz gol 'La mano de díos' - Foto: Veja/ Reprodução
Eis uma crônica – sobretudo – de confissão.
Confissão?
É, sou fã de Diego Armando Maradona...
Pra mim o craque argentino representa o futebol elevado ao status de arte, com suas arrancadas infernais que deixavam os zagueiros batendo cabeça, com seus dribles rápidos que os faziam de bobos, com seu petardo criminoso desferido por uma endiabrada perna canhota, com seu incrível e desumano controle sob a bola.
Pelé que me desculpe, mas Maradona detém um poder de sedução que ele, o eterno Rei do futebol, não tem: é mais humano, mais consciente, mais imprevisível.
Mas, justiça seja feita, nas quatro linhas o camisa dez de la tierra del Jorge Luis Borges fica um degrauzinho abaixo do santista, pois o brasileiro ganhou três Copas do Mundo, sendo uma delas aos 17 anos e a outra comandando um time formado por craques após ser alvo de um crime futebolístico na Inglaterra, em 1966.
Já nosso hermano, também responsável por feitos que deixariam William Shakespeare entorpecido, capitaneou a conquista da Copa de 1986, driblando meio time dos ingleses na segunda rodada da fase de grupo do Mundial. Maradona devolveu, com juros e correções monetárias, o ímpeto colonizador da política da dama de ferro, Margareth Thatcher, que descambou na Guerra das Malvinas, no início dos anos 80.
Bem feito, quem mandou impor o neoliberalismo por meio de armas, hum? Toma la mano de díos, dear Thatcher...
Se no certame digladiado nas quatro linhas Pelé não deixa a realeza do futebol tão fácil, fora dele – coitado – o Rei já despertou a fúria de seus próprios súbitos e gerou controvérsias: filho fora do casamento que só reconheceu após imbróglio judicial, flerte desmesurado com o paraíso da indústria do entretenimento nova-iorquina, aluguel de sua popularidade a desserviço de questões sociais como o racismo.
Ao voltar do México com a Jules Rimet em mãos, o camisa dez da Seleção Canarinha se deixou fotografar ao lado de ratazanas da ditadura civil e militar brasileira que, enquanto o craque brilhava nos gramados do México, promoviam a tortura contra opositores do regime nos calabouços da repressão. Pelé decepcionou.
Maradona, não: comuna, de peito, alma e pele... Sim, el díez tem uma tatuagem do líder da Revolução de 59, Fidel Castro, grafada no braço. Sempre se posicionou contra aos barões da bola, como narra – melhor que este escriba, óbvio – o jornalista e escritor uruguaio Eduardo Galeano, em “Futebol Ao Som E À Sombra”, obra lançada aqui pela L&PM.
Tem vício em cocaína, envolveu-se com a máfia italiana e protagonizou tretas? Sim, ora: humanos erram, estão suscetíveis a lapsos desgraçadamente horripilantes e se enveredam pelas mais indefectíveis variedades de cagadas. Por que haveria de ser diferente com Madona, hein?
Mas, vejam vocês: Maradona é Deus em Barcelona, Nápoles, Buenos Aires, só pra citar três deles – a memória do deste operário do texto está etilicamente enfumaçada, risos.
Pergunto-me: e Pelé? Sim, ele parou guerras, mas será que é tão amado assim?