- Júlia Lee
Feira anarquista
Doce Viagem

Caro leitor, hoje é segunda-feira. Há quem diga que é o dia em que as mazelas ecoam pelos pensamentos do trabalhador comum, aquele que tem uma jornada de 12 horas por dia e que recebe um salário mínimo. Mas eu te falo que segunda também é o dia do poeta, que acorda bêbado da noite anterior, aquela profunda noite em que viu o dia se estender enquanto colocava pra fora todas as angústias da consciência coletiva.
É dia de Doce Viagem.
Venho escarrar os pensamentos que me perturbam. O fogo me toma por inteira, percebo as realidades paralelas da obscura razão existencial entre o ordinário, nós estamos vivendo a apatia coletiva, e nada se faz. Acredito que como anarquista, meu papel é incendiar os corações, não somente de meus companheiros de luta mas aos que se perdem na ilusão do real. Ora, veja bem! Pra que serve um anarquista no mundo?
Caro leitor, o que eu vejo são movimentos inteiros de pessoas sem alma, como se o brilho revolucionário tivesse perdido entre o ontem e o amanhã. Nossa esperança sugada pela necessidade de continuar existindo, já não sobra tempo para a luta, e começo a refletir sobre o propósito do tempo. Os donos do poder estão nos tirando a percepção do tempo coletivo, exatamente para assim, nos tirar a mobilização.
A força interna, o ódio, a percepção do real cega as possibilidades infames de um não lugar. Ora, onde estamos? Para onde estamos indo? Não podemos fugir das perguntas infames destiladas ao incerto! Me causa palpitações no meu pobre coração ao perceber que já não temos fé na revolução nem para sequer nos questionar sobre tais perguntas.
Ah, meus caros, do que seria a luta sem o contínuo fluxo de consciência questionador? Afinal, será que não aprendemos nada com o passado? Ou somente, observamos as lutas e a deixamos atravessar os corpos etéreos de passividade, pasteurizados pela inércia coletiva dos movimentos revolucionários. Onde estão nossos companheiros de luta?
O que estamos esperando para a mobilização contra toda caretice, que visa a insalubridade da existência! O que estamos esperando para continuar a insurreição pela liberdade? Veja bem, caro leitor, não lhe peço uma esperança vazia e muito menos encontros banais de faíscas libertárias - à lá Feira Anarquista, onde numa feira de frutas você encontra mais anarquistas por metro quadrado do que no encontro anual da nossa comunidade em São Paulo.
Não estamos esperando o acaso nos tomar por inteiro. Muito menos um líder ou uma faísca vazia de esperança. Eu espero amor e revolução, ou amor à revolução, pouco importa. Caro leitor, deixe que o amor incendeie sua alma pela liberdade.