Lays Vieira
“Ser artista e indígena no Brasil é fazer parte de um momento histórico e até revolucionário”
Sede de Arte
Jaider Esbell, grande representante da arte indígena brasileira, é encontrado morto em seu apartamento em São Paulo

Jaider é encontrado morto. Foto: site Amazônia Real
Hoje o Sede de Arte é triste, mas vem para relembrar aos nossos leitores de que a arte é política e um espaço que deve ser ocupado pelos que não tem voz. O ano de 2021 foi marcado por várias perdas, não só em decorrência da covid-19. A mais recente dessas tragédias foi a morte do artista roraimense, curador, escritor e ativista sócio-cultural indígena Macuxi, Jaider Esbell, encontrado morto no último dia 2, em seu apartamento em São Paulo.
Aos 42 anos, o artista era um dos destaques da 34ª Bienal de São Paulo, do Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM), com a mostra "Moquém_Surarî: arte indígena contemporânea". A mostra reúne 34 artistas dos povos Baniwa, Guarani Mbya, Huni Kuin, Krenak, Karipuna, Lakota, Makuxi, Marubo, Pataxó, Patamona, Taurepang, Tapirapé, Tikmũ’ũn, Maxakali, Tukano, Wapichana, Xakriabá, Xirixana e Yanomami. Além disso, sua obra “Entidades” está em destaque no Parque Ibirapuera.
Atuando em um sistema ainda muito fechado, centralizado e elitista como a arte, Jaider se destacou ao longo dos anos, com obras fortes, carregadas de ancestralidade e posicionamento político. É considerado uma das figuras centrais do movimento de afirmação da arte indígena contemporânea no país. Isso se deve muito pelo I Encontro de Todos os Povos, realizado por Jairder em 2013.

Obra - Maldita de Desejada, Jaider Esbell, 2012 — Foto: Divulgação 34ª Bienal de São Paulo
Jaider nasceu em Normandia, norte de Roraima, atualmente onde se localiza a reserva indígena Raposa Serra do Sol, em 1979. Lá viveu até os 18 anos. Mudou-se para Boa Vista para dar continuidade ao seu desenvolvimento e entendimento enquanto artista e, anos depois, mudou-se para São Paulo.
Jaider Esbell é um dos artistas macuxis mais renomados de Roraima por trazer luz à vivência indígena por meio da arte. Também em 2013, começou a desenvolver e trabalhar o conceito de “artevismo”, ativismo contínuo em prol do resgate das motivações essenciais da arte indígena. Foi um artista que atuou de forma múltipla e interdisciplinar, sempre com um posicionamento decolonial, especialmente enquanto estratégia para dar voz e visibilidade aos historicamente subalternizados e oprimidos do nosso contexto.
Em entrevista, em setembro, a Agência Amazônia Real, Jaider destacou que o Brasil dos povos originários passou por um processo doloroso de apagamento cultural e de rechaço a intelectuais indígenas. O colonizador condicionou as culturas originárias a repetir padrões da religião, da moral e da arte europeias e agora querem se apropriar daquilo que não entendem, como o sagrado, a cosmogonia, a mitologia e a comunhão ambiental. A partir disso, Jaider partiu para uma estratégia de resistência, sempre se posicionando como um artista no front, numa postura de combate, resgate e de expor a realidade conflituosa, assim como a poética da vivência indígena.
Em vídeo postado no Instagram da Galeria Milan, em decorrência da apresentação da mostra Ruku, de curadoria de Jaider e assistência curatorial da antropóloga Paula Berbert, Jaider afirma que ser artista e indígena no Brasil é fazer parte de um momento histórico e revolucionário para o movimento indígena. Um movimento que, infelizmente, essa semana, perdeu um dos seus grandes guerreiros, mas que dará continuidade a luta. Para todos aqueles que tiverem oportunidade, vá a 34ª Bienal e prestigie as obras de Jaider. Acompanhem e prestigiem também os vários artistas dos nossos povos originários.

Obra Entidades, Jaider Esbell, 2021 – 34ª Bienal de São Paulo, FANAN/Fundação Bienal de São Paulo