Marcus Vinícius Beck
Um rolê etilista na noite paulistana
Crônica
Confira como foi a experiência de pernoitar numa casa de jazz, em São Paulo

Foto: Cantor Zudizilla durante show da banda paulistana Átrito Jazz/Júlia Lee
Minha capacidade em atrair os mais diversos tipos de experiências já me levou a vários lugares estranhos, mas sempre consegui sair dessas situações com certa eficiência. Veja bem, senhoras e senhores: só neste ano foram medo e delírio em Tiradentes (MG) e outras vivências que estão enevoadas em meu cocuruto. Levei as últimas consequências os ensinamentos literários do escritor Jack Kerouac, pai da geração beat e autor do romance “On The Road”, lançado em 1957.
Como sou um cara que curte jazz e tenho uma inclinação às coisas mais analógicas, me preparei para o rolê da noite deste sábado (31) ouvindo o clássico “Kind of Blue”, lançado em 1959 pelo jazz man Miles Davis. Afinal, Davis foi o responsável por modernizar o gênero com um groove dançante e cheio de charme. É claro que não havia outra forma mais eficiente para estar afiado do que deleitar a sonoridade de um dos discos mais fodas do século XX.
O que eu não esperava – ou talvez até desconfiasse no fundo, lá no fundo, para lhe ser franco, amigo leitor – era que o rolê seria extremamente elitizado, com uma arquitetura que me lembrou o solidário “Jay Gatsby”, do romance “O Grande Gatsby”. Adentrei o espaço, que ficava Rua Angatuba, n° 703, Pacaembu, com uma condição: precisava conceder assistência fotográfica (?) a Júlia Lee, que assina lindamente as fotos responsáveis por ilustrar este garrancho literário.
Nem preciso dizer que, se minha entrada não fosse na faixa e a minha parceira de trampo não tivesse conseguido isso para mim, provavelmente não teria redigido esta matéria, muito menos desfrutado de um jazz feito por músicos de altíssima qualidade. Sim, por mais que a mensagem de empoderamento negro não fosse assimilada pelo público, que era majoritariamente branco, o som que ecoava pelos alto-falantes distribuídos no ambiente potencializaram a vibe da Jazz Mansion.
Por tudo isso, é preciso frisar que as fotojornalistas mulheres (no caso, apenas a Júlia, resistindo no covil da macharada) foi atrapalhada por um grupo de homens munido de lentes ao invés de sensibilidade artística. Em algum momento da apresentação, fiquei pensando em como seria empurrar um desses caras só para vê-lo cair no chão. Se o sujeito achasse minha postura ruim, eu inventaria uma desculpa e iria embora. Optei, no entanto, por comprar mais uma cerveja Heineken long neck por 12 pila.
Para fechar este escrito, o jazz enquanto expressão artística é um encontro de culturas afrodescendentes. E a banda paulistana Átrito Jazz, uma das atrações da noite, foi o ponto alto dos diversos shows que rolaram na casa, com repertório baseado em canções de Robert Glasper, Herbie Hancock e do Fusion dos anos de 1970. Portanto, em meio à elite paulistana, nada melhor do que ver uma galera mandando ver versos impactantes sobre a cultura do jazz. Neste sentido, a cantora Laila Arruda deu show.
Viva a música!