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Tempos de moléstia

Atualizado: 5 de ago. de 2020

Botequim Literário do beck


Ilustração: Heitor Vilela/ Rabiscos e Escarros


Marcus Vinícius Beck


O cara, no caso este proletário das palavras, acordou meio esquisito. Pensou, o pobre coitado, que ia achegar-se à conchinha atenuadora da amada, aproveitando para dar um time deste Brasil ensandecido, mas não rolou, naturalmente: ninguém consegue pensar no chamego, no mero prazer dos corpos enquanto o noticiário voa como um kamikaze ceifador.


Pois é, botei então a parafernália verborrágica do Botequim Literário do Beck de molho. Não me restou outra escolha. Sem clima. Sem lirismo. Sem boemia. Não me julguem.


Mas, tristemente, não rolou nada, quer dizer, o Brasil continua caminhando rumo à mortandade coletiva. É a única, por mais desgraçada que seja, novidade do delírio do coturno.


Eis o batuque guiado pela trilha tche-tcherere-che-che bolsonarista: as onomatopéias da imbecilidade povoam a porra toda. Cacete!


São as lives da tragédia antevista, aquelas do Gustavo (o tal Lima e sua trupe). Ave Maria!


Batuco, após dois, três meses?, esta crônica buscando consolo no LP “Alucinação”, do genial trovador cearense Belchior. Que falta fazes, camarada do Coração Selvagem.


Atingimos, oh yes, pra usar um vocativo comum no idioma do seu brother, sicário fardado expelido do quartel, o marco das 80 mil mortes pela peste – a patológica e a política. Sim, os delinquentes da farda verde-oliva, os seus, nos matam por causa do neofascismo.


O ofício de preencher as páginas gutemberguianas proporciona que eu fique em casa. Sou um privilegiado, reconheço. No entanto, cenas mesquinhas encampadas por endinheirados coloca em risco a vida do precariado moderno. Meu sacrifício, nosso sacrifício, não é nada perto da labuta uberizada daqueles que são obrigados ao delivery do coronavírus pelo pão de cada dia.


A lista é enorme: diaristas, motoristas, camelôs, vigilantes e toda uma renca de trabalhadores que precisam ganhar o vintém do dia, afinal é incerto confiar na retórica neoliberal do engravatado que se gaba de ter estudado todas as teorias econômicas, e no original, risos.


Ainda assim, restam dúvidas, todavia, sobre a competência dele. Muitas, aliás.


Quem confia no cronograma do auxílio emergencial? Quem confia na eficiência dos aplicativos do socorro financeiro de, haja má fé guediana, 600 mangos?


Lembro-me da perversidade de rodrigueana. Mas nem Nelson dá conta de explicar o desastre anunciado. Um ministro abandona o MEC após atestar que, em sua cretina visão de mundo, era preciso prender “os vagabundos do STF”. O outro quer aproveitar a peste pra destruir a floresta. Aquela do plim-plim, bem aquela, nem me dou ao trabalho...


E o Frias, o tal Mario? E o quixotesco do MEC?


Tá, deixa eu corrigir: quais dos quixotescos do MEC? O primeiro ou o segundo?


Acho que os dois, né? É mais apropriado ridicularizar ambos.


Ok, ô Brasil compromissado com a demência coletiva, resta – eu sei – chorar as pitangas da despedida: Aldir Blanc, Sérgio Sant´Anna, Sérgio Ricardo, Moraes Moreira, Nirlando Beirão, Gilberto Dimenstein, entre outros gênios que nos deixaram órfãos de rebeldia, riso, combatividade, inteligência, sarcasmo e deboche.


As ruas, em outrora ocupadas por reacionários vestidos com o uniforme verde e amarelo, deram lugar às torcidas organizadas. Ao contrário do que preconizavam a galera do pão e circo, o ludopédio moveu uma onda de protestos – inédita na História do Brasil, por sinal –contra das dádivas autoritárias do capitão corona. Alentou nossos corações desalentados pela democracia.


Obrigado, companheiros.

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