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  • Júlia Lee

Primeiro vestibular específico para pessoas transexuais e não binárias é censurado por Jair Bolsonar

Diversidade

Vestibular inédito no brasil visava incluir pessoas trans no sistema público de ensino, a ação foi vista como uma vitória para o movimento LGBTQI+

Foto: Reprodução

A Universidade da Integração da Lusofonia Afro-brasileira (Unilab) lançou no mês passado um vestibular específico para candidatos transgênero e intersexuais, abrindo 120 vagas para 19 cursos em três campus, dois no Ceará e um na Bahia. Porém no último dia 16 de julho, o presidente Jair Bolsonaro informou por meio de suas redes sociais que o vestibular sofreria intervenção pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC).


A intenção da Unilab era aumentar o número de pessoas trans e intersex dentro do ensino superior. O que foi apresentado pela equipe do governo, foi a justificativa que pessoas não binárias, transexuais e travestis não entravam dentro da classificação do regime cotista, porém, é válido lembrar que as Universidades deveriam ter por jurisprudência autonomia regimental.


É o que afirma o artigo 207, da Constituição Federal de 1988:


“As universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão”.



Segundo a psicóloga, educadora e ativista do movimento trans, Beth Carvalho, em entrevista para o Jornal Metamorfose, “a educação possibilita abrir portas a este segmento populacional tirando da linha de subemprego e subcidadania. Com a educação essa população pode ser empoderada, além de retirar o trabalho sexual como única forma de sustento e empregabilidade”.


De acordo com os dados divulgados pela Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA), cerca de 90% da população trans acaba na prostituição. Pesquisas da ANTRA indicam que 82% deixam o ensino médio entre os 14 e 18 anos por consequência da transfobia nas escolas, o que leva somente 5% trabalharem com carteira assinada. Sem contar na violência cotidiana, que faz com que uma pessoa transexual tenha uma expectativa de vida 40% menor que uma pessoa cisgênero, sendo 75 anos para pessoas cis e apenas 35 anos para pessoas trans.


Com pouco acesso ao ensino público, pessoas trans e não binárias sofrem cotidianamente com o preconceito dentro das universidades. Theo Medina, estudante de artes visuais da Universidade Federal de Goiás (UFG), conta que as instituições não sabem lidar com pessoas trans. “No dia da matrícula disseram que eu não poderia solicitar o meu nome social logo na matrícula e que deveria pedir isso depois que ela fosse feita. A maior parte das pessoas responsáveis pelas ações acadêmicas da UFG, as mesmas que instruíram o que eu deveria fazer, não tinham a mínima noção de como tratar uma pessoa trans. Enfim, não tiveram cuidado em me direcionar certo, quase reprovei por falta, mesmo estando presente nas aulas, porque era constrangedor responder pelo meu nome de registro”, explica Theo em entrevista ao Jornal Metamorfose.


Foto: Sayonara Moreno, da Agência Brasil


Theo Medina conta que “a gente tá no país que mais mata pessoas trans no mundo, é proporcional, a gente vive um genocídio. Mulheres trans e travestis e homens trans não se prostituem por vontade, é a opção que nos é dada. Garantir acesso à nós a instituições de ensino superior é de certa forma tentar reduzir os danos de um genocídio praticado todos os dias no nosso país. Seria algo a ser descartado se as oportunidades fossem igualitárias e não são, então sim, da mesma forma que cota para etnias e outros tipos são necessárias também se vê essa mesma necessidade de ter cotas para pessoas trans e travestis”, explica ao JM.


Censura


A decisão do Ministério da Educação de cancelar o vestibular na Unilab é uma forma de impedir o reparo histórico causado por uma sociedade transfóbica, que só poderá transmutar suas desigualdades sociais através da educação pública.


Segundo a justificativa do MEC, a "Lei de Cotas não prevê vagas específicas para o público alvo do citado vestibular." Para a psicóloga Beth Carvalho, "aos olhos de uma educadora, e ativista política essa decisão só reforça um governo conservador com fundamentalismo religioso, pois o vestibular é processo de inclusão de pessoas, e incluir pessoas trans na universidade seria uma forma de resgatar uma dívida do Estado com essa população garantindo seu acesso à universidade”, explica Beth sobre o ocorrido.

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